domingo, 20 de junho de 2010

SARAMAGO PARA SEMPRE




Censurado por ter escrito O Evangelho Segundo Jesus Cristo, Saramago mudou-se de Lisboa para Lanzarote, nas Ilhas Canárias. Agora vive em sua arte bela e expressiva, coerente como viveu.

"José parado no meio da estrada, às volta com o pensamento, se de fato seria amigo de si mesmo ou se, de mais havendo razões para tal, se detestava ou desprezava, e, tendo pensado um pouco, concluiu que nem uma coisa nem outra, olhava para si mesmo com um sentimento de indiferença, como se olha o vazio, no vazio não há perto nem longe onde parar os olhos, em verdade, não é possível fixar uma ausência".
"No dia seguinte, ninguém morreu. O fato, por absolutamente contrário às normas da vida, causou nos espíritos uma perturbação enorme, efeito em todos os aspectos justificado, basta que nos lembremos de que não havia notícia nos quarenta volumes da história universal, nem ao menos um caso para amostra, de ter alguma vez ocorrdo fenômeno semelhante, passar-se um dia completo, com todas as suas pródigas vinte e quatro horas, contadas entre diurnas e noturnas, matutinas e vespertinas, sem que tivesse sucedido um falecimento por doença, uma queda mortal, um sucídio levado a bom fim, nada de nada, pela palara nada".

domingo, 31 de janeiro de 2010

As Time Goes By


O clássico do cinema mundial “Casablanca” ajudou a tornar desconhecida a verdadeira letra que Herman Hupfeld escreveu para a canção As Time Goes By.
O ritmo envolvente dessa música se espalhou pelo mundo durante a Segunda Guerra Mundial, depois de ter sido repetidamente tocada e cantada por Dooley Wilson em 1942, no filme Casablanca. Entretanto, ao mesmo tempo em que transformou a canção em um ícone mundial, Casablanca ajudou a fazer desconhecidas, as primeiras estrofes da canção que remete a um tempo de velocidade e mudanças, causando apreensão aos cidadãos e faz referência direta a teoria da Relatividade de Einstein.
No filme a canção será cantada pelo personagem Sam (Dooley Wilson) a pedido de Ilse (Ingrid Bergman) ao chegar ao Rick’s Café. Ela já conhecia o Sam e, sentando-se ao seu lado, próximo ao piano diz:
- Play it once, Sam, for old time’s sake.
E Sam retruca:
- I don’t know what you mean, Miss Ilsa.
Ela insiste:
- Play it, Sam. Play “As Time Goes By”.
- Oh! I can’t remember it, Miss Ilsa. I’m a little rusty on it.

Ao iniciar a canção com a estrofe “you must remember this…” é possível perceber que tem alguma coisa faltando. Atente para a canção.
A canção fora escrita por Herman Hupfeld para o musical da Broadway denominado Everybody’s Welcome e gravada em 1931 na voz de Rudy Vallee. Seu inicio, possui três estrofes desconhecidas para muitos dos amantes do filme Casablanca. Aqui estão eles:

This day and age we're living in
Gives cause for apprehension
With speed and new invention
And things like fourth dimension.

Yet we get a trifle weary
With Mr. Einstein's theory
So we must get down to earth at times
Relax relieve the tension.

And no matter what the progress
Or what may yet be proved
The simple facts of life are such
They cannot be removed.

You must remember this...

Em tradução temos mais ou menos o seguinte: Nesta época que estamos vivendo/é motivo de apreensão/em virtude da rapidez e de novas invenções/e coisas como a quarta dimensão./Ainda entendemos pouco/ sobre a teoria do Sr. Einstein/mesmo assim às vezes melhor conhecer a realidade/relaxar e aliviar a tensão./Mas, nada que o progresso tenha proporcionado/ou mesmo que já tenham provado/a verdade é que existem fatos corriqueiros na vida/que não podem ser esquecidos. E então, em Casablanca, ouvimos: VOCÊ DEVE SE LEMBRAR DISTO/UM BEIJO É AINDA UM BEIJO/UM SUSPIRO É APENAS UM SUSPIRO/AS COISAS FUNDAMENTAIS PERMANECEM/COM O PASSAR DO TEMPO...

Conhecendo as três estrofes que foram “degoladas”, podemos entender melhor o papel da canção no filme e a perfeição do discurso narrativo deste filme espetacular. Ao levar a estatueta como melhor filme em 1943, os que julgaram levaram em consideração a letra original da canção?

Ouça a canção na gravação original de 1931:



domingo, 13 de dezembro de 2009

Descoberta

Descobri pequeno
quando as palavras soaram
em minha boca;
quando meus olhos
penetraram
um mundo muito além
que os meus passos
conseguiam alcançar;
quando meus ouvidos ouviram
canções
que não sabiam existir.

Mas um dia
descobri que podia ser grande
ao saber que era capaz
de tornar as coisas grandes
pequenas,
assim como fazem
as formigas.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Circulário

E por mais que se esforce
é um só
um grito só
um gemido só
que cresce e acaba
sem deixar mais que espanto
sobre a intimidade do gesto

Um gemido só
um grito só
um só
por mais que se esforce
para ser além do gesto
alguém
como um nada crucificado
como um espanto ensanguentado
como um resto
que se torce.

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

AFORISMOS E FRAGMENTOS SOBRE A ARTE

1.
- Só a arte é útil. Crenças, exércitos, impérios, atitudes - tudo isso passa. Só a arte vê-se, porque dura.
2.
O valor essencial da arte está em ela ser o indício da passagem do homem no mundo, o resumo da sua experiência emotiva dele; e, como é pela emoção, e pelo pensamento que a emoção provoca, que o homem mais realmente vive na terra, a sua verdadeira experiência, regista-a ele nos fastos das suas emoções e não na crônica do seu pensamento científico, ou nas histórias dos seus regentes e dos seus donos [?].
Com a ciência buscamos compreender o mundo que habitamos, mas para utilizarmos dele; porque o prazer ou ânsia só da compreensão, tendo de ser gerais, levam à metafísica, que é já uma arte.
Deixamos a nossa arte escrita para guia da experiência dos vindouros, e encaminhamento plausível das suas emoções. É a arte, e não a história, que é a mestra da vida.
3.
Science describes things as they are; art as they are felt, as they are felt to be.
The essential things in art is to express; what is expressed does not matter.
Fernando Pessoa

SOBRE A ARTE

A história do desenvolvimento humano nada mais é do que uma disciplina longa de sensações. A obra de arte é a manifestação do sentimento.
Dividindo-se as sensações em cinco espécies de sentidos, devem os sentimentos corresponder a cinco espécies e igualmente as obras de arte.
Da sensação acústica vem a estesia acústica: sentimento nos sons, nas palavras - eloquência e música; da sensação da vista, a estesia visual, o sentimento na forma, no traço e no colorido, - escultura, arquitetura, pintura; da sensação palatal e olfativa nasce o sentimento do gosto e do perfume, - artes menos consideradas pela relativa inferioridade dos seus efeitos. A sensação do tato, secundada por todas as outras, dá lugar ao sentimento complexo do amor, arte das artes, arte matriz, razão de ser de todas as espécies de estesia.
(Raul Pompéia - O Ateneu)